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CABO VERDE NA ROTA DOS ESCRAVOS

2. Achamento das ilhas

2.2. O papel do arquipélago no tráfi co

A descoberta do continente americano aumentou a importância de Cabo Verde, porque se encontrava no meio destes caminhos. Muitos negociantes não queriam ir até África para comprar escravos. A capi-tal do arquipélago servia como entreposto de exportação de escra-vos, um “viveiro do gado humano” (Peixeira 2003: 30).

A maioria dos africanos capturados pelos portugueses vinha de Angola e do território do Congo. No início, então no século XV, a captura ocorreu sem qualquer organização especial (Th omas 1999:

37). Os nativos eram atraídos a locais de onde não pudessem escapar e de onde eram levados em cadeias a bordo dos navios negreiros.

Nesta época a maior parte dos escravos era transportada para Por-tugal onde eram distribuídos por personalidades dominantes. Entre eles, a Henrique o Navegador cabia um quinto dos cativos, com a venda dos quais podia fi nanciar as viagens marítimas (Peixeira 2003: 30).

Mais tarde a captura tornou-se mais difícil, porque as tribos afri-canas perceberam o que estavam a fazer os brancos, tinham medo deles e tentavam fugir e esconder-se. Os trafi cantes precisavam de uma nova tática. Levaram com eles intérpretes –anteriormente leva-dos à Europa, ou que eram descendentes destes – que falavam as línguas indígenas. O primeiro objetivo dos portugueses foi obter in -formação sobre a geografi a e economia dos povos de cada área. Em seguida começou a compra por permuta entre tribos africanas e os europeus. Trocaram os escravos por vestuário, cavalos, algodão ou por âmbar. As guerras frequentes entre as tribos forneceram cons-tantemente cativos (Peixeira 2003: 31, 48).

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A primeira estação dos navios negreiros era Ribeira Grande, onde descarregavam as suas mercadorias. Toda a capital cabo-verdiana foi construída para servir este tráfi co. Primeiro os escravos eram diri-gidos ao coração da cidade, à praça central, ao Pelourinho, onde eram distribuídos por género e idade, e depois eram “alojados”, sendo que a sua estadia podia durar de alguns dias até meses. Esta praça também funcionou como mercado humano e as punições também aconteceram aqui, por isso permanece até hoje o símbolo do espetá-culo público do castigo. Os abusos corporais para a manutenção da

“disciplina” eram comuns. Os escravos eram vistos como animais ou máquinas, não tendo nem livre-arbítrio nem outros direitos. Muitos deles fugiram para o interior da ilha. Os proprietários esclavagistas não tinham as condições apropriadas para recuperar os fugitivos.

Assim no interior de Santiago nasceram pequenas aldeias de cabanas de colmo e desenvolveu-se a agricultura de subsistência dos peque-nos camponeses (Peixeira 2003: 50–59).

Antes de chegar ao seu destino fi nal, todos os escravos tinham de ser batizados para entrarem como cristãos no Novo Mundo. Por causa da falta de padres a cerimónia regularmente tornava-se cole-tiva. O batismo gigantesco costumava acontecer em frente do altar, mas em Ribeira Grande era na rua, fora da catedral, porque não foi permitido aos escravos entrarem. Assim também se pode ver que este foi um batismo económico e não de fé (Henriques 2016). Os escravos receberam um nome cristão e não podiam praticar mais as suas religiões, respeitando as disciplinas cristãs. Os padres proferiam discursos semelhantes: “Considere que daqui em diante és fi lho de Cristo. Vais partir para o território português, onde aprenderás assun-tos da fé. Nunca pense mais no teu lugar de origem. Não coma cães, nem ratos, nem cavalos. Esteja contente.” (Th omas 1999: 813)

Paralelamente ao batismo, os escravos receberam também um ca -rimbo, uma marcação com ferro quente. O carimbo serviu como um código de barras, e assim os comerciantes sabiam quais escravos lhes pertenciam. Como foram vendidos várias vezes, era bastante comum

129 que um escravo tinha vários carimbos em diferentes partes do seu corpo (Peixeira 2003: 49).

O tráfi co de escravos foi a principal fonte de receita em Cabo Verde, cujo desenvolvimento económico se deu graças aos impostos que os navios negreiros tinham de pagar. Comparando com outras colónias africanas de Portugal, o arquipélago tinha uma situação de privilégio. A sua economia desenvolveu-se rapidamente, o que foi também visível na paisagem urbana. O primeiro bispado criado na África tropical foi o da Nossa Senhora do Rosário. A igreja foi constru-ída em 1495 num estilo manuelino e o edifício está ainda hoje em bom estado (Peixeira 2003: 47–51). Durante séculos, a igreja foi responsável pelo ensino. A metrópole enviou mestres e educadores franciscanos para Santiago desde o início, o que não era comum nas colónias. Os brancos e em breve os mestiços também tinham acesso à educação.

Por conseguinte, o número dos analfabetos sempre era signifi cativa-mente menor que nos outros países africanos (Knoema 2015).

A economia da metrópole estava intimamente ligada ao tráfi co, por isso durante séculos o porto da Ribeira Grande foi um dos mais protegidos no Império Português. A Fortaleza de São Filipe – que até hoje guarda a cidade – foi atacada regularmente por piratas de várias nações. Os concorrentes queriam assim enfraquecer o papel de Por-tugal no comércio atlântico. Ribeira Grande foi atacada várias vezes, e Francis Drake – o herói nacional dos ingleses e pirata temido aos olhos das outras nações – também liderou um ataque em 1585 contra Santiago (Britannica).

A viagem para as Américas durava no início alguns meses, mas no século XIX já menos de seis semanas, dependendo do destino e das condições meteorológicas. A base de dados mais pormenorizada que temos sobre o tráfi co de escravos é o Trans-Atlantic Slave Trade base, mas na verdade estes números são também somente estimati-vas. Segundo esta base, entre 1500 e 1866 cerca de 12,5 milhões de africanos foram levados para o Novo Mundo. Estima-se que quase dois milhões de pessoas embarcadas morreram durante a viagem.

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Muitos morreram de diferentes doenças ou foram atirados para a água para não infetarem os outros. Os suicídios também eram bas-tante comuns depois de os cativos perceberem que nada de bom os esperava no outro lado do oceano.

Nas Américas os escravos não tinham à sua espera um futuro próspero. Tinham de fazer duros trabalhos físicos nas plantações, para não mencionar os variados instrumentos de tortura. Uma grande parte, 41% dos escravos, foi levada para o Brasil e 48% para as Cara-íbas, sendo que somente 5% para os Estados Unidos. Esta distribui-ção pode ser explicada com a diferente atitude dos colonos no Norte e no Sul. Os do Sul fi zeram trabalhar os seus escravos até morrerem de exaustão, por isso lá os africanos morreram em alguns anos, sendo necessário o seu abastecimento constante. No Norte os colo-nos tinham uma atitude diferente. Os escravos de lá tinham uma vida mais longa, tendo menos trabalho e também podiam ter famí-lias. À primeira vista, essa atitude parece mais humana, mas na ver-dade foi por uma questão fi nanceira. Os colonos no Norte apoiavam a reprodução dos seus escravos, porque assim podiam vender os seus descendentes também. (Slave Voyages)